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Tuesday, June 2, 2020

|Part 1| Carta ao Meu Primeiro Amor: Dr. Karla Maria


nota:
perdoe os erros nesta tradução; não escrevo em português há muitos anos. 

Escrevi esse tributo sem imaginar que perderia uma pessoa muito querida, Renee French, atriz e enfermeira em um hospital em Manhattan. Gostava tanto de ser enfermeira que deixou pra tras uma carreira promissora como atriz. Trabalhou com Spike Lee e Jim Jarmusch's Coffee and Cigarettes e depois de ter tantas ofertas pra outros filmes decidiu se tornar enfermeira. Andávamos de madrugada sozinhos pelas ruas de New York e ela sorria e me dizia sarcasticamente: " Marco, veja como é bom ser famoso. Ninguém nos incomoda." Enquanto bebia seu nauseante café com gelo.


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  A realidade é realmente mais estranha que a ficção, a menina de 9 anos que eu amo cresceu para salvar o mundo.



| Sou fácil de identificar; Eu sou o cineasta que não se importava com a moldura, a câmera ou qualquer outra coisa quando ela estava por perto. Karla é a menina fosforescente.|




(Um tributo a todas médicas, enfermeiras e funcionárias)


PART ONE


Quando deixei Afonso Arinos, Brasil, eu tinha 11 anos. Eu dei um beijo de despedida na minha avó; para nunca mais voltar até quase 30 anos depois. Sou órfão; e ser órfão dá a você solidariedade com todas as minorias, todos condenados ao mesmo destino de não ter uma unidade para se definir, e ter que se forjar com os materiais deixados para trás por outras pessoas. Não sei se isso é verdade, mas sempre achei que os órfãos de todo o mundo gostam de viajar: conhecer novas pessoas, experimentar novas culturas, falar novos idiomas; para esconder o fato de que não pertencemos a lugar algum.

Deixei para trás minha avó, um rio e suas cintilantes águas marrons, mangueiras, jabuticabeiras, minha escola primária e Karla Maria, o meu primeiro e grande amor.

Você, Karla Maria, foi e ainda é um segredo que guardo em meu coração durante toda a minha vida. Um amor puro que reside em mim, sempre, como oxigênio puro, reservado para situações de emergência. As lembranças do amor que senti por você, um outro ser humano, em uma época em que a inocência prevalece, é a coisa mais próxima que um ateu tem da divindade. Houve momentos em minha vida que a memória de você aos 9 anos de idade foi a única coisa que me manteve vivo e são. Eu sei o quanto aborrecimento eu causei a você: escrevendo cartas de amor, olhando para você durante as aulas, com ciúmes de qualquer outro garoto que falasse com você; (sim Frederico, também não te esqueci. Espero que esteja bem e com saúde.)

Eu não pude me prevenir de te amar, acordei um dia e lá estava você, e não havia mais nada. Não sei explicar bem o começo de um amor. O começo de um grande amor não é como o começo do universo, não é uma criação, é uma força que já existe em algum lugar e é mais poderosa do que qualquer coisa ao redor. Deus criou o mundo em uma exibição espetacular de poder e matemática; o amor ele criou no domingo, seu dia de folga. Quando Newton, um fervoroso crente, estava tentando explicar a lei da gravidade, ele mencionou um éter, ele estava descrevendo o amor, ele simplesmente não sabia disso. O amor une; revolta, no melhor sentido da palavra. Um dia você está bem, seguindo seu dia a dia, e de repente você sente, e o amor consome todos os momentos do seu dia e noite; você se torna um corpo celeste viajando em torno de sua órbita.

A última lembrança que tenho de você, Karla, estávamos dentro de um ônibus, quando tínhamos 17 anos. Lembro de caminhar até a parte de trás do ônibus para dizer olá para você e sua mãe, mas por alguma razão agora tenho dúvidas se realmente conversei com você naquele dia. Eu tinha escrito minha terceira peça e estava a caminho de assistir a apresentação no Rio de Janeiro. Lembro-me de conversar com você sobre isso; mas também questiono essa memória porque não consigo me lembrar do seu rosto. De alguma forma, meu cérebro excluiu todas as suas imagens, exceto quando tínhamos 9 anos de idade. Seu rosto está esculpido em minha memória, em meu coração, e eu visito nossa sala de aula toda vez que a vida fica um pouco insuportável. É o meu superpoder.

Eu sempre respeitei a sua memória; por isso, confesso que não ouvi falar de você nem pensei em você como adulta até o início das mortes, na Itália. O país dos meus antepassados, meu avô; de Dante e sua Beatriz. Duvido que ele tenha amado sua musa o tanto quanto eu amo você; ele era melhor em expressar isso. Sorrio pela simplicidade e inocência dessa afirmação. Dante é meu escritor favorito e Divina Comédia meu livro favorito, é também um lugar onde encontro refúgio de vez em quando; é igualado apenas a Dom Quixote, outra obra-prima de um homem dilacerado pelo amor e destinado a perambulações sem rumo. Eu me relaciono mais com o Quixote; melhor companhia. Se você está passando pelo inferno, seu companheiro de viagem deve ser gentil, engraçado e um facilitador. Uma pitada de loucura também é necessária.

Quando os corpos começaram a se acumular ao redor do mundo, fiquei sentado contemplando as vidas perdidas e, pela primeira vez, desde os 11 anos de idade, depois de me certificar de que meus filhos estavam seguros em minha casa, pensei em você. Eu desejava saber que você estava bem e segura. Tenho que confessar a você que foi só então que fui procurar por você, a versão adulta de você. Não gosto nem um pouco das mídias sociais, não há nada de social nelas, mas foi útil para encontrar você; e eu tive uma surpresa.

A garota de 9 anos que eu amo cresceu e estava lá na linha de frente, enfrentando um inimigo invisível que mata tudo em seu caminho; Fiquei feliz em descobrir que você é exatamente o que eu pensei que você seria aos 9 anos de idade.

Fiquei feliz de saber como você está vivendo sua vida. Você encontrou o que a maioria das pessoas em Hollywood e no mundo todo procuram e não conseguem encontrar: amor verdadeiro. Você conheceu seu marido, vocês dois estudaram medicina, se casaram e tiveram três lindas filhas. As muitas cartas de amor que escrevi para você quando criança, não tem comparação com as lindas mensagens de amor que o Dr. Fernando, seu marido, escreve para você em seu perfil de mídia social. Vocês dois conseguiram encontrar o que o resto de nós esperamos, uma alma gêmea; e vocês não tinham como saber que todos os sacrifícios que você fizeram seriam imperativos para salvar a vida de seus vizinhos. Vocês estão vivendo uma bela história de amor e seus filhos têm sorte em te-los como pais; sua cidade é abençoada por ter vocês dois como médicos residentes.

Enquanto eu fico em casa, são e salvo, vocês e a comunidade médica estão lá fora, salvando a vida das pessoas. No meio de um surto de vírus mais perigoso de nossas vidas, vocês dois arriscam a vida que construíram para salvar os outros. Ver o mundo pegar fogo é um tema comum no cinema e, a partir do momento em que essa pandemia começou, eu sabia que precisávamos nos preparar para uma situação difícil. Eu leio muito. Tenho uma biblioteca pessoal de quase 3.000 livros e li alguns deles; também li alguns livros sobre a pandemia de 1918 e sei o quão perigosa é essa situação. E agora eu tenho a memória da minha querida Renee que se foi em 2020.

Me enfurece assistir os políticos jogando seus jogos tolos, garantindo uma proliferação do vírus e multiplicando as pessoas que sua comunidade terá que tratar. Foi esse sacrifício que me levou a escrever essa carta de agradecimento disfarçada de carta de amor; ou talvez seja o contrário. Eu não sei. Está tarde. 3:20 da manhã agora. Eu mantenho um horário de artista.

Sou artista, de profissão e temperamento, minha avó sabia disso, eu ficava ali sentado, pensando em você, e ela se aproximava de mim, chamava meu nome e me batia no topo da cabeça algumas vezes; Eu olhava para ela a tempo de vê-la balançar a cabeça, me beijar e ir embora novamente. Era o jeito dela de me dizer: "o que quer que seja que você está pensando em fazer, não faça". Eu deveria ter escutado ela. Mas não ouço bem, nem mesmo minhas próprias vozes que me disseram para não escrever essa carta. Houve um debate interno; Eu venci. Meu crítico interno apontou para mim os pessimistas, o povo cínico e argumentou que eles tomariam isso da maneira errada, mas eu respondi que você e seus colegas médicos estão lá no campo de batalha mais perigoso que se possa imaginar, lutando contra um inimigo que você nem sequer pode ver. Escrever uma carta de agradecimento é o mínimo que posso fazer.

As eternas vozes interiores sugeriam que seria um pouco inapropriado escrever uma carta de amor para uma pessoa com uma família, mas eu não escutei. Esta é uma carta de amor para uma época que já passou; uma carta de amor da minha criança interior pra sua criança interior, a criança de 9 anos que me conhecia bem e não ficaria surpreso com minhas travessuras. Lembrei-me de Angelina Jolie ganhando um Oscar, e de estar tão feliz que confessou ao mundo inteiro o amor que carregava em seu coração por seu irmão, sim, seu irmão. No dia seguinte, algumas pessoas muito loucas e odiosas estavam lá, sugerindo que ela estava tendo um relacionamento sexual inadequada com o irmão. Pessoas pequenas e absurdas.

Enquanto estou aqui sentado fico pensando na eternidade do amor, na fragilidade da vida, Tom Cruise me veio também à mente; ele também foi ao show da Oprah e pulou no sofá para anunciar ao mundo que amava outro ser humano; e ele também foi castigado. Também nunca entendi isso. Me lembro ouvir alguém dizer, e cito o mesquinho "ele está fora de controle". Me recordo de pensar na época: "evidentemente, é claro que ele está fora de controle, está apaixonado. Eu não acho que ele está pulando alto o suficiente nessa poltrona. "

Talvez Karla, depois de assistir a uma demonstração de coragem vinda da sua comunidade, nos uniremos ao redor do mundo e exterminaremos esse outro vírus, porque está sufocando nosso espírito livre, a parte de nós que quer viver plenamente e cometer erros. Os seres humanos devem se unir contra todos os tipos de sentenças de morte; seja físico ou espiritual. Para a multidão odiosa, esta carta será o que será, embora eu espere que ficar em casa por causa do coronavirus ensine essas pessoas alguma empatia e humildade. Seja pequeno, mas não detestável. O próprio Terminator, Arnold, ensinará isso na parte dois. Sim, há outra parte.

Não tenho o pragmatismo necessário para ser médico, Karla, mas minha imaginação me permite voltar à nossa sala de aula e vê-la novamente, várias vezes; olhando para mim, irritada com minhas cartas de amor, envergonhada pelos presentes que lhe dei, todos eles, como você sabe, coisas que "liberei" da minha avó. ( Em linguagem de cinema nunca se rouba nada: se libera, copia, presta homenagem) Em minha defesa, só lhe dei as coisas que ela mais amava. Nos meus momentos mais sombrios, quando não há amor ao meu redor, e prejudicado pelo meu ateísmo, viajo de volta no tempo em meditação, para vê-la. Um pensamento engraçado me ocorreu pela primeira vez; quando volto a vê-la, só vou à sala de aula no segundo andar, a último sala à direita, próximo ao banheiro onde ficava o fantasma da mulher com o algodão no nariz; Só Deus sabe por que ela ficava lá. Pensando bem, esse fantasma viaja muito porque li em algum lugar que ela estava assustando crianças em Nova Jersey. Pobre fantasma! Nova Jersey? Talvez por isso todos querem escapar de lá.

O que acabei de perceber é que escolhi visitar a sala de aula no andar de cima porque ainda não havia Frederico, ele veio mais tarde. Quão ridículo eu era? Talvez ainda seja. Acabei de fazer essa conexão. A maior sala de aula, como você sabe, é a que fica em frente à escola, as janelas atrás de mim na foto, eu nunca visito essa sala. É assombrada pelo Frederico.

Pablo Picasso, um homem que nada sabia sobre o amor, apenas conquistas frívolas, disse uma vez que um artista deve permitir que sua criança interior assuma o controle; eu também acho. Sento-me na sala de aula no andar de cima, assistindo Tia Zélia escrevendo “Interpretação de Textos” no quadro-negro; Olho ao redor da sala e sinto todo o seu amor enchendo minha alma. Sinto falta da Tia Zélia, ela era minha anja da guarda. Eu lembro dela olhando para mim e balançando a cabeça, sorrindo toda vez que eu lhe entregava um poema, ou uma das coisas da minha avó. Lembro-me de que toda vez que Tia Zélia vinha à minha casa, para devolver seus presentes, eu corria para a janela da frente da minha casa e olhava para a igreja, com a nossa escola primária ao lado, e a casa onde você morava e eu imaginava você lá dentro: irritada e despresenteada. O círculo de flashback amoroso em que volto é sempre o mesmo: olho ao redor da sala, olho para você, você fica irritada e desvia o olhar ou gesticula para que eu olhe para o quadro. Você também era bem irritadinha, né? Fala a verdade.

Outro dia, Karla, vi uma entrevista com o governador da Flórida, um homem que se recusou a instruir as pessoas a ficar em casa e meses depois quando 900 pessoas por dia estavam morrendo na Itália, teve a audácia de dizer que ninguém conhecia esse vírus, e que ninguém sabia que era tão poderoso e que pessoas assintomáticas podiam transmiti-lo. Agora, por causa de suas manobras políticas e estupidez pessoal, a equipe médica em toda a Flórida terá alguns meses horríveis pela frente. Eu gostaria de ver imagens do governador da Flórida enterrando alguns dos corpos para que ele entenda completamente a sentença de morte que dispersou contra as pessoas que votaram nele e a tortura que ele impôs a equipe médica na linha de frente. Karla, esses são os pensamentos que me levam à meditação. Estes são os pensamentos que me trazem a você e o amor que você fornece.

Ontem à noite, depois que 1.700 pessoas morreram nos EUA em um dia, viajei de volta no tempo e fiquei lá, assistindo Tia Zélia e você. Desta vez, quando você olhou para mim, eu quase lhe disse a verdade: “Karla, eu vim do ano 2020, ainda te amo da mesma maneira, mas você encontrará o amor da sua vida, um garoto chamado Fernando, vocês dois farão faculdade de medicina juntos e se tornarão médicos. Você cuidará de crianças e seu marido será cirurgião; juntos criarão três lindas e incríveis filhas. Seu marido também é político, mas deixarei isso passar; você o escolheu e "In You I Trust."

Mas eu não disse nada, fiquei sentado olhando para você e ponderando sobre o perigo que você está enfrentando no ano de 2020 e temia que você percebesse minhas preocupações. Você parecia tão pequena sentada ali que eu me senti triste e chorei, pensando: "como é que essa menina tão pequena enfrentará uma pandemia que matará milhões de pessoas em todo o mundo"? Senti orgulho em amar você. Eu me sinto inútil sentado aqui escrevendo isso.

Adoro escrever e dirigir é o meu dom, mas estou em casa, absolutamente inútil contra esse inimigo, assim como muitas, muitas estrelas de cinema famosas, heróis de ação, astros do rock, jogadores de futebol e celebridades de todos os tipos. Somos irrelevantes quando importa. Ricky Gervais não estava brincando e agora é óbvio; somos artistas e este é o momento de figuras heróicas reais: Bruce Willis, Arnold Schwarzenegger, Sylvester Stallone, Tom Cruise e Will Smith não precisam se inscrever. O mundo está morrendo de uma pessoa por vez e eles não têm as habilidades necessárias para o trabalho. Então eles devem se esconder em casa com o resto de nós, observando médicos como vocês, funcionários de limpeza de hospitais, enfermeiras, coletores de lixo, coveiros, enfrentar a tempestade.

Em um futuro próximo, quando alguém estiver pontificando sobre como é incrível e talentoso, ocupado dizendo quantos seguidores eles têm nas mídias sociais, pergunte a eles onde estavam durante a pandemia de 2020; quando lhe disserem que, assim como eu, estavam em casa, escondidos, desejam-lhes bem e diga que você está feliz por estarem vivos. Não há mais nada que você precise saber deles.

É realmente inspirador o que a sua comunidade está fazendo, e como deve ser assustador entrar e sair de seu equipamento de proteção não podendo ver onde o inimigo está. A minha querida Renee, esteja onde estiver tem o meu amor e admiração.

A realidade é realmente mais estranha que a ficção; a menina de 9 anos que eu amo cresceu para salvar o mundo, uma pessoa de cada vez; não nas páginas de um romance ou na tela de cinema, mas na vida real onde importa. E ela está fazendo isso em silêncio, como uma boa garota cristã.

E seu companheiro de aventuras é chamado Dr. Fernando, o amor de sua vida. Não é essa uma linda história de amor?