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Tuesday, June 2, 2020

|Part 3| Carta ao Meu Primeiro Amor: Elos Psicológicos.

nota: perdoe os erros nesta tradução; não escrevo em português há muitos anos. 

Escrevi esse tributo sem imaginar que perderia uma pessoa muito querida, Renee French, atriz e enfermeira em um hospital em Manhattan. Gostava tanto de ser enfermeira que deixou pra tras uma carreira promissora como atriz. Trabalhou com Spike Lee e Jim Jarmusch's Coffee and Cigarettes e depois de ter tantas ofertas pra outros filmes decidiu se tornar enfermeira. Andávamos de madrugada sozinhos pelas ruas de New York e ela sorria e me dizia sarcasticamente: " Marco, veja como é bom ser famoso. Ninguém nos incomoda." Enquanto bebia seu nauseante café com gelo.




                                                        | November 28th, 1969 |



(Um tributo a todas médicas, enfermeiras e funcionárias)


PART 3
Estou sentado no quintal da minha avó, pensando: em você, Karla, minha mãe inexistente, meu avô, em mim mesmo. Tenho em mim todo o conhecimento do meu passado e de tanto futuro, que fico aqui tentando encontrar uma maneira de ajudar essa criança de 9 anos a entender que há muita vida pela frente. Entro na casa e olho para minha avó; ela está fervendo leite; Sinto o amor dentro de mim transbordando, saio na ponta dos pés e vou para a escola para vê-la...

No caminho da porta da frente, vejo meu avô, sentado ouvindo seu rádio. Rádio teatro, sobre uma mulher que é morta e volta do túmulo para levar a alma de alguém; é assustador. Observo meu avô sentado aqui, quieto, e me pergunto o que ele está pensando. Ele é como você, Karla, sempre distante, sempre pensando e comendo chocolate; não meu avô, você, meu avô come pimenta malagueta. Olhe que surpresa, uma outra memória.

Estou de pé agora na cozinha, maravilhado, do lado esquerdo da mesa, meu avô está sentado na cabeceira da mesa, do lado direito, e ele agora tem um prato na frente dele. Ele pega algo na mesa; Não vejo de onde ele as está tirando, mas posso vê-las com clareza; enormes, vermelhas e assustadoras. "Nunca coloque isso na sua boca", diz minha avó. Ele pega o garfo e esmaga toda as pimentas malagueta no prato, enquanto minha avó lhe serve feijão, feijão preto, que ele mistura na pimenta. Ele está comendo e suando. Estou aos pés dele assistindo, "O que você está fazendo aí, vovô?"

Agora estou na sala de estar. Eu acho que sei o que meu avô pensa o tempo todo: "Por que no mundo faço isso comigo mesmo? Porque eu como pimentas malaguetas?"Agora, só me falta saber o que você, Karla, pensa, sentada ali comendo o" chocolate redondo "que você trazia de Niterói.

Quando a morte está por perto, minha mente se atordoa. E salto no tempo.

Eu ando pelo Rio de Janeiro com uma garota que conheci em uma festa. Eu tenho cerca de 19 anos. Estamos conversando desde o momento em que nos conhecemos, e me sinto incrível. Ela gosta de Chico Buarque, ela ama Dante, ela, como eu, já leu Divina Comédia duas vezes, e passamos a noite inteira conversando sobre isso. Ela toca oboé. Eu canto para ela uma música que escrevi. É de madrugada e caminhamos ao longo da orla marítima do Rio de Janeiro.

Um ar frio sopra do oceano, conversamos sobre Quixote agora e rimos de suas insanidades. No começo da noite, contei a ela sobre minha mãe, como ela deu à luz a mim e ao meu irmão, e como todos os adultos em sua vida decidiram a colocar-la em uma instituição mental e foram viver suas vidas. Como as pessoas na pandemia, ela morreu naquele hospital muitos anos depois. Como que pra me torturar, uma vez por ano, eles me levavam ao hospital psiquiátrico para visitá-la, e a cada ano havia menos e menos de minha mãe e menos e menos dentro de mim mesmo. No caminho de volta, eu escutava em silêncio, eles se elogiando por terem tirado tempo das suas agendas lotadas para visitá-la.

Uma vez, quando eu tinha cerca de 20 anos, tive um colapso nervoso no caminho de volta, os vizinhos de meu pai me levaram para ver minha mãe. Eu estava suando, congelando, no meio do verão, e todas as janelas do carro estavam fechadas. Ar condicionado soprando ar frio. Eu não conseguia respirar. Depois que eles se reuniram com meu pai, foi decidido que eu estava tendo uma dificuldade psicológica em aceitar o fato de que estava ficando calvo. ( As mentiras que os adultos dizem pra si mesmo pra evitar a verdade e justificar suas covardias. ) Meu pai me sentou para uma palestra e eu fiquei ouvindo, em silêncio, ciente da futilidade de tentar explicar qualquer coisa a um homem que não me conhecia. Albert Camus estava certo: " A mais importante pergunta filosófica a ser respondida é o suicídio..." Eu tentei me matar alguns meses depois; e quando sobrevivi, me afastei de Deus e de suas promessas de uma vez por todas e decidi viver; e sair de perto dos meus familiares. E já fui tarde. Cheguei a Nova York aos 21 anos de idade.

Tenho uma lembrança de minha mãe, duas na verdade, e tentei filmar uma delas com três atrizes, sem sucesso. O diretor de fotografia não conseguiu acertar as luzes, eu não consegui encontrar a alma da cena e o assistente de direção me incomodando, tentando determinar se era mesmo importante aquela cena para a minha narrativa.

Quando minha mãe foi internada, meu pai saiu por aí procurando um lugar para colocar seus filhos gêmeos. Depois de morarmos com duas pessoas, antes dos seis meses de idade, minha avó colocou o pé no chão e moramos com ela até os 11 anos. Meu pai morava a uma hora e meia de distância de nós, e o víamos uma vez por ano, no Natal. Alguns natais, ele nunca veio, mas enviou uma carta escrita a mão; tinha uma caligrafia linda. Ele era extremamente orgulhoso disso.

Estou de volta ao Rio de Janeiro, olho para a garota de novo. Ela tem cabelos pretos, os mais lindos olhos verdes e não desvia o olhar dos meus quando olho para ela. Eu a beijei horas atrás, então agora só estou interessado em sua mente. Estou ouvindo ela me explicando Camus. Ela não acredita que não li Camus e agora está rindo muito porque confundi Albert Camus com meu poeta português favorito Luís Vaz de Camões. “Não é Camões, idiota. é Camus "e se desfaz de tanto rir.

No momento em que as palavras saem de sua boca, lembro-me da minha avó que me batia sem nunca deixar seu amor de lado. Ela disse isso em um tom carinhoso, cordial, de cumplicidade, empatia e familiaridade. "Essa garota," eu penso admirado, "está fazendo tudo certo." O sol está prestes a nascer e nos sentamos para assistir; isso vai ser espetacular. Nos beijamos novamente e assistimos o nascer do sol. Ficamos sentados por um longo tempo, vendo o sol nascer em uma das vistas mais bonitas do mundo, Ipanema, Rio de Janeiro, a cidade maravilhosa. Ela me pergunta se eu posso levá-la em casa e eu: "bem, o que você acha que eu disse?" Claro que sim.

Caminhamos até o barco que ela deve tomar para chegar em casa. Sentamos em um lugar que não me lembro bem, esperando o barco. Ela mora em uma ilha. Eu gosto dela, e é óbvio que ela gosta de mim e fazemos a jornada juntos para a cidade dela. Nós mal falamos. Chegamos do outro lado e esperamos que todos saiam primeiro; não temos pressa e quando caminhamos em direção à rampa, eu a puxo pelo braço carinhosamente e digo adeus.

Estou tão surpreso com isso quanto ela. Ela me descreve o caminho de sua casa, e me convida pra visitar um pequeno café onde podemos sentar e conversar um pouco mais; nossa conversa se transforma em um interrogatório onde ela indaga se fez algo errado. Ela está preocupada de ter dito algo que me ofendeu e digo que não e que realmente gostei de conhecê-la, mas tenho que ir.

Não tenho justificativas nem pra mim mesmo e nem razão, mas todo o meu ser quer voltar para o Rio de Janeiro. Eu de cima do barco ainda a vejo se afastando em terra firme, na cidade de Niterói, enquanto eu flutuo em direção ao Rio de Janeiro me sentindo vazio por dentro. Muitos anos depois, durante a Pandemia de 2020, descobri que, aparentemente, sem o meu conhecimento, havia me prometido nunca pisar na cidade de Niterói e não estava disposto a quebrar essa promessa para alguém que acabei de conhecer. Mas por não ter esse conhecimento, eu flutuo incapaz de entender o que aconteceu. Eu gostei dela, passamos uma noite fantástica conversando. Eu me sinto desconectado de mim mesmo, como se um elo dentro de mim estivesse faltando, um elo que viria a explicar por que eu me afastei de uma garota bonita, inteligente e que adora a ler tanto como eu. Eu me sinto perdido. Me sinto vazio. Eu nunca mais vi aquela garota.

Estou de volta agora, ao lado do meu avô, ele está ouvindo o rádio. Ele não me vê, sou um viajante no fuso horário dele. Penso em abraçá-lo pela primeira vez, mas não o faço.

Não posso dizer o porquê.
Os elos que não vinculam,
Os Grand Canyons em nossa mente, que
engolem traumas inteiros; pro fundo da alma.

Chego na escola, mas percebo que não estou na escola; estou atrás da casa do Marcelo sendo levado a uma mesa onde você se senta, Karla, com Christiane e algumas pessoas out of focus. Nós olhamos um para o outro. Você está jogando um jogo de palavras em que se precisa nomear coisas diferentes com letras específicas, eu ouço você dizer…

COR: preto. ANIMAL: pato.

Os links que ligam para cidades erradas para lugares onde estamos vazios por dentro, mas nos recusando a morrer.

Camus está certo: “Existe apenas um problem filosófico realmente sério, e é a questão do suicídio. Decidir se a vida vale ou não a pena é responder à pergunta fundamental da filosofia. Todas as outras perguntas seguem a partir disso ... ”

Sento na nossa sala de aula, Tia Zélia está aqui como sempre, mas desta vez não posso ficar. Você não pode me ver. Há algo horrível chegando e você vai ser médica e deve prestar atenção na aula. "I'll be back."



                                                    


    -----------------End of PART THREE ------------